sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Balinhas duras.

Um dia após o mundo parar com as tentativas de triplicarem o tempo em um só, fazendo meus últimos 2 meses passarem mais devagar que Rubinho na F1, me deparei com uma cena inusitada. Um amigo me chama para almoçar (a cena se dá durante esse encontro). Aceito. Tiro minha carteira e óculos da bolsa e as repouso sobre a mesa do escritório. Olho pela enésima vez o relógio do notebook. A situação atual se resume ao ócio, e o nada me consome inteira como se eu fosse uma balinha barata e dura, dessas de 5 centavos na boca de um velho sem a dentadura. Esse velho é o tempo. Uma jogada do tempo tão velha quanto ele próprio. Retomo a consciência de que eu ainda existo e termino o café servido. E com essa ideia de existência revejo minha situação, um F5 em mim. Cara, como pude parar aqui? (Uma das perguntas mais frequentes.) Até outro dia eu ia de moletom trabalhar, mas trabalhava, não tinha lacuna na minha agenda para as oficinas do Diabo na minha cabeça. Agora tudo é marasmo, tudo é buraco, negro talvez. Deixei o escritório. 11º andar. Vou de encontro ao meu amigo. Entro no elevador, dou boa tarde para quem entra até o térreo. A recepcionista diz bom almoço. O sol dá um tapa na minha cara. Reencontro meu brother, penso no quanto ele é importante pra mim. Dou um abraço meio sem jeito, não estou para contatos físicos com ninguém. Ele olha pra mim e diz: Essa é fulana, trabalha comigo, vamos almoçar juntos. Já escolheu o lugar?
Depois disso acho que a cena poderia ser congelada, eu olharia para a câmera e diria: WTF? Quem é ela? Por quê? Pensei que fôssemos falar sobre nossas vidas idiotas e você me traz uma estranha. Aplausos. Obviamente isso só aconteceu na minha cabeça, porque olhei para a mulher, sorri, mostrei bem minhas covinhas simpáticas e disse as palavras padrão: Tudo bem? Prazer, fulana.
Uma figura toda atrapalhada, bem vestida, secretária. E depois disso pularei para as vias de fato: o almoço à 3. Resolvi fingir que a conhecia tão bem quanto meu amigo e falei das novidades antigas, sobre sexo ou mais precisamente a falta dele, e do quanto eu não tenho nada a dizer sobre meus problemas, eles que falam demais e alto na minha cabeça, esses problemas que falem sozinhos, pois é óbvio que não irão obter resposta minha. Durante a conversa meu amigo se diz perdido e desfocado, a moça se diz só, e eu? Digo o que? Não sei o que dizer, não escrevo há meses, não acompanho mais os lançamentos de filmes, meu trabalho não anda e muito menos se arrasta, meus amores se vão mais rápido que a fumaça do meu cigarro e o meu pai? Ah pai, meu coração só sabe dizer que ainda não é tua hora, pra aguentar firme. Mas eu sou apenas mais um corpo entre alguns 7bilhões. 
Meu amigo pergunta: Quem é você e o que fez com a minha amiga? 
Taí a cena inusitada, acho que a entreguei para o tempo transforma-la em mais uma entre o proletariado que esqueceu sua alma em algum armário de casa.

Um comentário:

  1. Quem é você atrás desse uniforme passado e com cheiro de confort? É esse sorriso e a fala seguinte do bom dia costumeiro para alguém dentro do elevador? Acende teu cigarro, mas não quer morrer de câncer. O adulto, e acima de tudo, o ser humano que nos tornamos, somos responsáveis pelos nossos machucados, nossos cigarros e nossas contas a pagar. Então você sobe no metrô, arruma a bolsa nos ombros firme para não cair ou não correr o risco de ser assaltada, sente teus pés latejando nesses sapatos pretos de salto alto, chega em casa e finalmente veste-se de si. Em que espelho ficou perdida tua face? Se encontre logo. Então mesmo que você seja o bom dia apesar do mau humor pra primeira pessoa que encontrar, dê bom dia para si e tome seu café. Tenho certeza quem em algum lugar tu te deixou. Não deixe o café e o coração esfriar. Um abraço, guria.

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